As crianças pequenas são as maiores vítimas
das viroses de inverno. Não cruze os braços! Alguns cuidados simples vão
deixar as defesas do seu filho mais resistentes
Os bebês nascem com o sistema imunológico cru. Assim como as
habilidades de andar e de falar, essas defesas amadurecem com o tempo e à
medida que a criança entra em contato com vírus e bactérias. Tanto que
muitos pediatras acham comum que, até os 2 ou 3 anos, os pequenos
apresentem de sete a oito infecções anuais. Especialmente se freqüentam
desde cedo berçários e creches, onde a convivência com outras crianças e
com os funcionários da instituição normalmente se encarrega de
socializar as viroses. "O recém-nascido já tem o arcabouço de seu
sistema de defesas pronto.
Mas é como um livro em branco onde ele irá escrever as receitas de como
combater as infecções e outros agentes estranhos a seu organismo",
explica Victor Nudelman, pediatra e imunologista do Hospital Israelita
Albert Einstein, em São Paulo. "A criança pode preencher as páginas em
quatro ou em dez anos. Depende da exposição que terá a microrganismos
potencialmente perigosos." Não é possível nem aconselhável manter o bebê
numa redoma, evitando que pegue gripes e resfriados, porque são essas
experiências que o ajudam a esculpir suas defesas. Mas o ideal é moderar
essa exposição, especialmente no primeiro ano de vida, para não
sobrecarregar o organismo ainda "inexperiente".Não significa, porém, que
você deva ficar de braços cruzados esperando que seu filho escreva
sozinho o livro de sua imunidade. Existem várias recomendações que,
colocadas em prática já, o ajudarão a fortalecer suas defesas. Vamos a
elas:
Valiosas regras de higiene
Lavar as mãos antes de pegar o bebê e esterilizar chupetas, mamadeiras,
copinhos e brinquedos que vão à boca são cuidados que evitam a
superexposição de seu filho a germes, bactérias e vírus. "Esses
conceitos básicos muitas vezes são deixados de lado", observa a
neonatologista Alice Deutsch, do Albert Einstein. Da mesma forma, convém
evitar que pessoas gripadas fiquem muito perto do bebê nos primeiros
meses. São precauções simples que preservam um pouco suas defesas ainda
frágeis.
Proteção em cada mamada
Não é de hoje que você ouve dizer que não há nada melhor para o bebê do
que o leite materno. Tanto que os especialistas recomendam que a
criança seja alimentada exclusivamente com ele até os 6 meses de vida.
Pois aí vai outro forte motivo para insistir nessa tecla: além de todos
os nutrientes importantíssimos para o crescimento de seu filho, seu
leite é fonte de várias substâncias que fortalecem as defesas dele. A
começar pelo colostro, aquele líquido ralo dos primeiros dias. Uma das
poderosas substâncias que ele contém é a imunoglobulina IgA, um
anticorpo que se espalha pela mucosa intestinal infantil formando uma
barreira bioquímica que impede a penetração no organismo de bactérias
perigosas.Outra substância vital é o oligossacáride, um açúcar que
estimula a proliferação de uma flora intestinal também disposta a
combater tais bactérias. "Com essas substâncias, a criança amamentada
fica mais protegida contra problemas como a diarréia", explica o
pediatra Fábio Ancona Lopez, professor de nutrologia da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp).
O leite materno também injeta no organismo do bebê milhões de glóbulos
brancos, a principal célula de defesa do nosso corpo. "Além de tudo
isso, é fonte dos chamados fatores inespecíficos, substâncias que
potencializam o desempenho dos glóbulos brancos e dos anticorpos
produzidos pela criança", completa. Mas não se desespere se não
conseguir suprir as necessidades de seu filho até os 6 meses
preconizados pelos pediatras - situação bastante comum entre mulheres
que voltam ao trabalho depois da licença-maternidade. "Um período de
quatro meses de amamentação exclusiva já é considerado satisfatório pela
Organização Mundial de Saúde", tranqüiliza Lopez.
Frutas e legumes têm a força
O efeito é indireto, mas igualmente importante. Assim como o corpo,
para se fortalecer o sistema imunológico precisa de vitaminas e sais
minerais. "Eles ajudam a modular as reações químicas necessárias para a
produção de anticorpos. Ou seja, se o organismo dispõe desses nutrientes
nas quantidades ideais, consegue produzir uma resposta imunológica mais
rápida", explica Nudelman. Uma alimentação balanceada, especialmente
rica em frutas e legumes, principais fontes de vitaminas e sais
minerais, é, segundo Ancona Lopez, suficiente para dar uma força extra -
e preciosa - às defesas do pequeno. A maneira de conseguir isso é
engatar um programa esperto de desmame, oferecendo a ele uma boa
variedade de alimentos sólidos.
O poder restaurador do descanso
Pesquisas neurológicas mais recentes garantem que boas horas de sono
são imprescindíveis para fortalecer o sistema imunológico. "Estudos
feitos com ratos mostraram que depois de 72 horas sem dormir eles
apresentavam alto risco de contrair infecção generalizada", diz o
neurologista Mauro Muszkat, coordenador do Núcleo de Atendimento
Neuropsicológico Interdisciplinar da Universidade Federal de São Paulo. A
explicação é simples. Em primeiro lugar, se não dormimos direito,
produzimos mais hormônios do stress, que acabam prejudicando o
desempenho das células de defesa do organismo. Segundo, é durante o sono
que fabricamos uma quantidade maior de substâncias que estão
diretamente ligadas tanto à produção de anticorpos quanto ao desempenho
dessas células. Portanto, certifique-se de que seu bebê durma o
suficiente: de 16 a 20 horas por dia, no caso dos recém-nascidos; de 14 a
15 horas, incluindo as sonecas diurnas, para os bebês de 6 meses a 2
anos. Cuidar para que a criança tenha um sono de qualidade também é
importante. O que significa proporcionar a ela um ambiente tranqüilo,
sem barulho, com luz reduzida e que não incida em seu rosto.
Carteirinha de vacinas em dia
Elas são uma maneira de expor a criança ao agente infeccioso de forma
controlada e, com isso, dar ao sistema de defesa a oportunidade de
fabricar os anticorpos. Dessa forma, quando o bebê for exposto à
bactéria ou ao vírus de verdade, seu organismo já terá como combatê-lo
ou no mínimo amenizar os efeitos. "A maioria das vacinas utilizadas nos
calendários de imunização recomendados pelos médicos e pelo governo tem
eficácia próxima a 100%", diz o pediatra Roberto Bittar, da Cliap -
Clínica de Imunização Pediátrica, de São Paulo. Para que seu filho se
beneficie dessa proteção, porém, é fundamental vaciná-lo nas datas
indicadas.O roteiro de prevenção começa com a vacina contra a hepatite
B, cuja primeira dose deve ser dada ainda na maternidade. O mesmo vale
para a BCG, que imuniza contra a tuberculose. A partir daí, você traça
com o pediatra o caminho a seguir. Hoje em dia, quem tem disponibilidade
de pagar um pouco mais para imunizar o filho em instituições
particulares conta com vacinas de última geração, que apresentam várias
vantagens. As combinadas, que reúnem num único produto a proteção contra
várias doenças, estão nesse grupo. "A tendência é cada vez mais
produzir vacinas com o maior número de combinações possíveis. Dessa
forma, diminuímos o número de injeções que a criança toma e a
necessidade de visitas freqüentes aos locais de imunização", observa
Bittar. Um exemplo disso é a vacina conhecida como pentavalente, que
engloba a Salk (contra poliomielite), a tríplice (coqueluche, difteria e
tétano) e a Haemophilus influenzae (meningite e infecções
generalizadas). Ela é dada em quatro doses: aos 2, 4 e 6 meses, com
reforço aos 18 meses. São portanto quatro picadas. Se optar pelas
convencionais, seu filho terá que tomar 12 picadas. A Haemophilus
influenzae inaugura ainda outra conquista: graças aos avanços
tecnológicos que incorporou, pode ser aplicada já a partir dos 2 meses
de vida. Antigamente, apenas crianças de 2 anos ou mais receberiam esse
tipo de imunização. "Aí ela já não era tão necessária, pois as crianças
correm maior risco de contrair as infecções que essa vacina previne
justamente nos dois primeiros anos", conclui Bittar.
Como funcionam nossas defesas
Nossa estratégia de defesa começa com a pele, que reveste o corpo e
barra os agentes agressores externos. "Mas é em nosso organismo que
estão os soldados mais especializados em combater infecções e outras
doenças", afirma Marco Aurélio Sáfadi, pediatra e infectologista do
Hospital e Maternidade São Luiz, em São Paulo. O exército mais numeroso é
composto de glóbulos brancos, células "patrulheiras" que percorrem
nosso corpo à procura de vírus, bactérias e outros invasores que possam
causar algum dano. Identificando algum deles, elas imediatamente
disparam uma ordem para a produção de anticorpos, as imunoglobulinas,
cuja missão é eliminar o inimigo. Esses soldados de ataque são altamente
especializados: para cada agente infeccioso, o sistema imunológico tem
que bolar uma "receita" específica de anticorpos. "Se é a primeira vez
que o organismo do bebê identifica o microrganismo, levará algum tempo
para preparar a resposta. Mas automaticamente ele irá memorizá-la e, da
próxima vez em que o vírus aparecer, será mais prontamente combatido",
explica Sáfadi.
As armas que ele recebe ainda no útero
Nos últimos três meses de gestação, a mãe passa uma provisão de
anticorpos para o bebê que o protegerá nos primeiros 6 meses de vida.
"São anticorpos contra as doenças que ela já teve ou contra as quais foi
vacinada, como o sarampo. Depois eles perdem a validade e caberá ao
bebê fabricar as próprias defesas", esclarece Marco Aurélio Sáfadi,
pediatra e infectologista do Hospital e Maternidade São Luiz, em São
Paulo. Esse é mais um dos motivos para que a mãe faça um pré-natal
caprichado e se previna contra os riscos de ter o filho prematuramente.
"Os bebês prematuros são ainda mais vulneráveis a infecções, porque não
contam com essa proteção imunológica adquirida ainda no útero", diz a
neonatologista Alice Deutsch, do Hospital Israelita Albert Einstein,
também em São Paulo.
A magia do toque
Que a massagem aprofunda o vínculo entre mãe e bebê pouca gente duvida.
Mas vários estudos tentam verificar se esses toques teriam a capacidade
de fortalecer o sistema imunológico da criança. "Existem indícios de
que a massagem desencadeia alterações no sistema nervoso central, que
teriam como reflexo a ativação ou modulação das defesas da criança",
observa a enfermeira e psicomotricista Maria das Graças Barreto Silva,
coordenadora do Grupo de Massagem e Estimulação de Bebês, do
departamento de enfermagem da Universidade Federal de São Paulo. Mesmo
que os efeitos na imunidade não tenham ainda comprovação científica, não
custa tentar: no mínimo, será um momento de prazer compartilhado entre
mãe e filho.
